Relação entre Sport Billy e a Criatividade

01-11-2015 01:09

Algumas palavras sobre o Sport Billy e a criatividade

João Luís Cruz Bucho[1]

criatividade e fantasia, imaginação, sport billy e criatividade
Imagem representativa de Sport Billy

Retirado: www.google.pt

Genérico versão em Inglês:www.youtube.com/watch?v=huJlDsfXf5U

Introdução:

Este texto tem como objectivo fazer uma breve analogia entre a figura de animação, Sport Billy e a criatividade. Para isso, recorremos à imagem metafórica da mala mágica do jovem herói, de onde tudo é possível retirar, relacionando-a com a capacidade transformadora e transformativa que a criatividade possui, tão necessária nesta sociedade que constantemente reclama por ideias e soluções novas, para fazer face às exigências da actualidade e poder contribuir na promoção de um futuro melhor, mais integrado e integrativo.

Desenvolvimento:

Sport Billy, quem ainda se recorda desta série de animação?

Quem se lembra do herói de outro planeta, da sua amiga Lilly e do cão falante Willy, que viajavam na nave espacial, lutando contra as diabruras da malvada rainha Vanda, que tinha como missão destruir todos os desportos da galáxia?

Trata-se da história de uma série de animação que passou na RTP no início da década de 80[2] e que retractava as aventuras de um jovem que possuía uma mala mágica, de onde retirava todo o tipo de objectos que necessitava e que viajava numa nave espacial, também ela mágica, com a forma de um despertador. A mala era mágica, pois conseguia transformar tudo, ajudando-o a ultrapassar imprevistos e a satisfazer as diversas necessidades. Bastava um pequeno movimento, retirar o objecto da mala colocá-lo na palma da mão e zás … o objecto transformava-se naquilo que pretendia e servia para ajudar o rapaz nas mais diversas ocasiões. A base da história em desenhos animados representava a importância de se promover o trabalho em equipa, defendendo o espirito desportivo e do fair-play.

Esta série teve bastante sucesso na Europa, aliás rapidamente se tornou num fenómeno à escala mundial, tendo chegado à América, ao Brasil e a muitos outros países, tendo a personagem sido adaptada pela própria FIFA, Fédération Internationale de Football Association, como mascote de fair play em vários campeonatos do mundo de futebol (ex. Mundial de Espanha 1982, Mundial do México, 1986[3]).

Actualmente vivemos num mundo significativamente novo, em constante mudança, muito devido à evolução do conhecimento científico e tecnológico, patente nas importantes conquistas e evoluções ocorridas nas últimas décadas, que deram origem a uma revolução radical na nossa visão do tempo e do espaço, assim como da própria evolução humana, que vieram alterar comportamentos, posturas, formas de ver e de nos relacionarmos com a realidade, questionando tudo e todos. A pós modernidade e a globalização trouxeram consigo novos desafios e oportunidades, que obrigam a que todos os agentes e instituições, alterem a sua visão, transformem-se e adaptem novas estratégias, renovando-se e reconstruindo-se, aceitando o novo.

No entanto, vivemos ameaçados sob o espectro de uma grave crise[4], ao nível político, social e económica, onde impera os problemas sociais, a falta de oportunidades, para os jovens, adultos e desempregados. Esta geração vive marcada pela nostalgia de não ser capaz de conseguir triunfar no mercado de trabalho, de não poder crescer feliz, nem realizada num mundo onde tudo já se encontra criado, produzido, tudo existe à nossa disposição, pronto para ser utilizado, numa rede fechada sobre si mesma. O próprio saber ao deixar de ser construído e criado pelo sujeito, apresenta-se já pronto e acabado, à nossa disposição. A aprendizagem é efectuada através de técnicas e metodologias pedagógicas onde predomina o apelo à exposição, a cópia, a memorização e a reprodução passam a fazer parte do dia-a-dia.

Vivemos assim na era da robótica, do conhecimento técnico e científico, onde as emoções, os afectos são afastadas do nosso dia-a-dia. O instrumental, o raciocínio lógico e linear, o espirito racional e apolíneo, afastam e muitas vezes marginalizam o espirito criativo, divergente, dionisíaco. Impera a lei do mercado, tudo é consumido e tudo serve como alvo consumo. Consumir, é estar na moda, comportarmo-nos como todos os outros. A moda aparece relacionada com o novo, com a modernidade, com a fama, o sucesso, o bem-estar, a riqueza e a prosperidade.

Todos nós ambicionamos a fama, a vida fácil, entrar em concursos, participar em reality show tipo: Big Brother VIP e não VIP, Survivor, The Voice, Ídolos, Operação Triunfo, Desafio Total, 1ª Companhia, Perdidos na Tribo, Circo de Celebridades, A Bela e o Mestre, Casamento de Sonho, Casa dos Segredos, a Quinta das Celebridades, de forma a saltarmos da penumbra para o mundo das luzes da ribalta, do conhecido, do dinheiro fácil, das presenças, das revistas cor-de-rosa, das entrevistas, da fama. Da mesma forma jovens, rapazes e raparigas, homens e mulheres, correm obsessivamente para os ginásios, com o intuito de esculpirem os seus corpos e tal como Adónis, aproximarem-se dos seus ídolos, dos ideais pré-concebidos e assim estarem prontos para o social, para se tornarem visíveis, neste mundo tão rápido, global e globalizante. Tal como Sport Billy, herói de outro planeta, é uma criança do planeta Olympus (planeta existente no lado oposto do Sol), que é habitado por seres atléticos com aparência de deuses. O homem deseja, ambiciona ser e tornar-se deus, quer ao nível físico quer ao nível mental. Copiam-se maneiras e modas de estar, comportamentos e modas, no sentido da uniformização, de sermos parecidos com os nossos idolos.

O euro milhões é um bom exemplo daquilo a que todos recorremos, semana a semana, na tentativa de alcançarmos um dos seus prémios e conseguirmos obter um maior desafogo em termos financeiros e que nos permite ter uma vida mais tranquila e acedermos à tão propagandeada euro excentricidade.

Neste mundo tão incerto e complexo onde as desigualdades sociais e económicas são tão marcantes, todos desejamos encontrar a mala da felicidade, a mala dos euros fáceis, da fama e do sucesso! Por vezes desejamos a mala por diversas vezes, contudo no nosso entendimento este não é o caminho! Temos de parar e reformular a forma de pensar, de ver, sentir e agir perante a realidade. Tornamo-nos seres não pensantes, não actuantes, seres consumidores passivos, adultos com o piloto automático ligado, tipo personagens pré-fabricadas e afastamos as actividades lúdicas, expressivas, criativas, reflexivas, cooperativas, aquelas que nos põem constantemente em acção, que nos fazem aprender - fazendo, que agilizam e mobilizam as diversas facetas e competências.

Lembramo-nos do poeta dos “múltiplos eus”, a quem a literatura dava corpo e alma. Segundo Ricardo Reis, pensar incómoda, é como andar à chuva. É preciso pensar.

Em vez de sonharmos em ter/possuir uma mala multiusos como a mala do Sport Billy, temos de aceitar que todos somos portadores dos recursos necessários para a renovação, recriação e transformação da realidade e de nós próprios. Não precisamos da posse da mala já que todos dentro de nós a possuímos, embora de forma simbólica, um tesouro que graças à imaginação criativa podemos transformar e recriar, passando a enfatizar não a esfera do Ter mas sim a do Ser. Para se Ser é preciso conhecer.

“A criatividade é determinante para a inovação e constitui um factor crucial para o desenvolvimento de competências pessoais, profissionais, empresariais e sociais, bem como para o bem-estar da sociedade”

Comissão Europeia – 2009, Ano Europeu da Criatividade e Inovação

Ao utilizarmos a criatividade estamos a mobilizar e estimular as diversas competências do sujeito, activando as diferentes dimensões, implicando directamente a imaginação, a fantasia, a flexibilidade, a investigação, a exploração, o espirito critico, a curiosidade, o questionamento, entre outras. Este tesouro que todos temos, aqui mencionado sob a forma de mala, mas que quando nos tornamos adultos rapidamente esquecemos e deixamos para segundo plano, afirmando erradamente que a criatividade é só para alguns e não é de todos, deve ser continuamente estimulada e ginasticada, durante toda a vida. A criatividade precisa de ser acarinhada e alimentada para poder crescer, precisa de estimulação para viver. Só assim se poderá desenvolver!

A mala tratar-se-á de uma autêntica caixa de pandora, de onde poderemos retirar todas as qualidades, competências, conhecimentos, virtudes, necessárias para o nosso dia-a-dia. Dentro dessa mala, que somos nós mesmos, existe uma multiplicidade de perspectivas, implica um novo olhar, mais profundo e abrangente, oferecendo várias possibilidades de vir a Ser. Trata-se de um mundo mágico a explorar, em constante renovação e inovação activa permanentemente, onde se encontra tudo o que se precisa, um mundo diferente, subjectivo, lúdico, multissimbólico, multicromático, multissensorial, e polimórfico.

Neste sentido o sujeito ao invés de ser um ser passivo e que recebe algo já produzido e feito, passa a ser encarado como um ser activo, dinâmico e responsável na construção do conhecimento, adoptando uma nova postura, aberta, plural, afectiva, expressiva e criativa.

Da mesma forma que a personagem Sport Billy não caminha sozinho, embora seja um herói que é portador de uma mala com potencialidades mágicas, é constantemente auxiliado pela sua amiga Lilly e pelo cão Willy, também nós seres humanos, não devemos caminhar sozinhos neste percurso que é a vida. Precisamos de promover e valorizar o diálogo, a partilha, a colaboração e a reflexão entre as diversas gentes, culturas, conhecimentos, valores, tradições, criando novas relações, vínculos, redes e dinâmicas, temos de nos abrir ao (s) outro (s), abandonando velhas concepções egoístas e solipsistas, para nos convertermos em seres altruístas, proactivas, assertivos e criativos, na verdadeira essência Humanista do Ser.

Precisamos de abrir o nosso coração ao Amor, amar e ser amados.

 

Algumas imagens representativas de Sport Billy – Campeonato do Mundo de 1986, México

Retirado de: www.google.pt



[2] Desenho animado de 1979, produzido pela Filmation Associates.

[3] Imagens ilustrativas no final do trabalho

[4]  Etimologicamente a palavra crise em grego significa cruz ou encruzilhada. Daí importa superar esta encruzilhada, através do espirito da aventura, do questionamento, da criatividade e transformar os desafios em novas oportunidades.